25 março 2016

SER JOGADOR OU PARECER JOGADOR: RECADO PARA JOVENS JOGADORES

Rodrigo Vicenzi Casarin

Está na moda a carreira de futebolista. Todas as crianças, pré-adolescentes ou adolescentes barbados querem ser jogadores de futebol. A projeção midiática que o futebol representa e suas múltiplas possibilidades despertam ainda mais o interesse. 

E ao caminhar nesse mundo/futebol cada pessoa/jogador que é única vai sendo modelada pelo contexto inserido. O que mais percebemos aqui no Brasil é que essa modelação vem cada vez mais condicionando os jovens há adquirirem um DNA prostituído, muito pelo que se fala, se veste e pelo pouco poder reflexivo. Além disso, pelo entendimento que ser jogador é “ganhar muito dinheiro” e ter fama precocemente. 

Isso seria uma síndrome viral? É tão fácil ser jogador assim como parece? Será que a grande maioria dos jogadores que chegaram a top não precisaram de uma gama de situações complexas e adversidades? Não precisam estudar nessa nova dimensão que a sociedade se tornou? Será que vestir um boné, uma chuteira de marca, ter um empresário ou um pai fissurado pelo dinheiro e pela fama já garante o sucesso? Ser jogador é diferente de parecer jogador? Ser jogador não precisa de esforço, compromisso e escolhas?


Olha, como treinador fico cada vez mais pasmo com “esses entornos do futebol”. Tudo que rodeia está cada vez mais poluído, parece ter mais fissuras que a camada de ozônio. Hora parece um grande Cirque du Soleil, hora uma passarela da Fashion Week e hora uma fila para chegar ao “Cofre do Banco Central”. A arte da estrada que é ser jogador está cada vez mais apontada para outros valores que faz os jovens terem a impressão que é fácil ser jogador, e que a paixão de jogo virou "piada pronta", e nós adultos temos culpa de tudo isso.

Desse modo, cada vez mais vão ficando des-familiarizados com o mínimo que é gostar da bola, e o credo do esforço e da superação ficam esquecidos. E nem se dão conta que esse contexto poluído e a falta de leitura individual deixa mais próximos de seguir carreira como modelos, grandes craques do videogame ou apostadores de mega-sena. 

Por isso, uma pequena porcentagem realmente chega ao alto-nível, e esses trabalham muito, se esforçam mais ainda, e se preparam muito mais que o resto. Ou vocês acham que Cruyff, Rivaldo, Iniesta, Pirlo, Busquet, Willian e Coutinho apenas pelas condições naturais, pela hereditariedade, dom e talento ou por terem aterrissado de uma nave espacial de Saturno chegaram a Top. Não consigo ver outra situação ou um segredo mirabolante para ser jogador maior que treinar mais que os outros, jogar 10 horas por dia futebol e desfrutaram do futebol mais que qualquer coisa. 



Há apenas uma magia, que não é segredo, simples, que é o desenvolvimento pessoal de se dedicar e focar cada vez mais. Quando mais energia se coloca numa situação, quando mais se treina, quanto mais se abdica de algumas coisas, quanto mais experiências precoces, variadas se tem, mais se forma e mais possibilidades tem de evoluir. É uma questão clara, pois se realmente quisermos ser jogadores, temos que nos preparar e nos preparar muito mais que qualquer um. 

Como disse antes, no futebol não apenas um perfil único, cada um suas experiências. Não há uma receita escrita e única para adquirir “o mapa da mina”. Ninguém é igual a ninguém, mesmo que o inconsciente coletivo tente cria um rebanho comum ao conceito de ser jogador. Há sim algumas regras básicas que devem ser utilizadas por todos, que vão além do futebol, que servem para a vida geral, ou seja, antes que qualquer coisa o jogador precisa ter paixão pelo que faz, saber resolver problemas internos-externos, valorizar as coisas adequadamente, saber distinguir situações e pessoas, suportar solidão, esforço e especialmente ser resiliente mentalmente. Dessa forma de nada de nada adianta um jovem ser taxado com um vasto potencial precocemente, se pelos entornos, e sua falta de mentalidade, utiliza desastrosamente suas capacidades e seu gerencialmente pessoal. Por isso, desde cedo, fatores limitadores que cegam pode fazer o jovem desencontrar sua essência, e cada dia ao invés de vivenciar uma experiência agradável e intensa; um sentimento precioso e profundo que é jogar, vira apenas uma situação corriqueira e fria que vai congelado. 

Hoje os preceitos culturais da sociedade e as ambições tiraram um pouco dessa sede essencial para ser jogador e criaram estereótipos. Também a facilidade com que as coisas chegam, algumas mentiras plantadas, alguns produtores de sonhos, feirantes de ideias mirabolantes e a falta de gestão familiar vão lapidando a estrada dos jovens que perdem seu estado mais puro e singular. Cada vez mais ficam perto de rotas mercantis, de estados de patrimônio fantasiosos, tudo motivado por esses processos informacionais criados ao seu redor. Será que não seriam processos mais des-informacionais que informacionais? 

Infelizmente, jovens, não nascemos com a capacidade de controlar a nos mesmo, dirigindo nossa “inteligência potencial” para metas elegidas. Somos contexto, ou seja, envolta cria-se um gênero especifico de percepção que cada vez mais se afasta da polidez ética para viver com honestidade e paciência para que os fatos lenta ou rapidamente se concretizarem. Queremos ser jogador com 5 treinos e 2 gols numa partida amistosa contra uma equipe de videogame e ganhar milhões. Não consigo entender.    


Dessa forma, o jogador precisa saber precocemente que ao criar alguns laços com todos esses aspectos extra-campo, pode se acorrentar e correr um grande risco de ficar preso num presidio de segurança máxima por um período, e quando sair, o mundo já não ter as mesmas características. Claro, o jogador não vive numa ilha, é um ser social que se relaciona constantemente e tem suas escolhas, o jogo é isso também, mas de que forma essas escolhas podem ir construindo a subida ou descida do jogador? Abdicar de ter coisas que todos os jovens tem, vícios, curtições, uma vida familiar mais ativa e manhã de sonos mais tranquilas entram nessas escolhas?

Como treinadores podemos contribuir para os jovens jogadores “perceberem algumas coisas”, criando processos de treinos mais complexos, reflexivos, para sentirem mais o jogo na sua essência, dar conselhos, criar seres autônomos, mais críticos, capazes de tomarem boas decisões, gerirem suas emoções e conviverem adequadamente nesse meio, já que um deslize, uma escolha errada, uma pessoa errada, pode colocar em risco tudo. 

Mesmo esse entorno tendo uma grande evidência e várias dimensões, a gestão da auto-responsabilidade do jovem não pode deixar de estar em primeiro plano. Governar atos e consequências é a grande chave para ter projeção. 

Então para “ser realmente” jogador, e não viver de um protótipo, uma propaganda, mais que todas essas questões citadas, tem um preço a pagar, que custa “vários valores”. E nesses valores está o trabalho duro, não se render nunca, não se entregar, paixão pelo jogo, pelo treino e o sonho de ser jogador para pisar no gramado e jogar uma grande final num estádio cheio, tudo isso distante num primeiro momento do sonho de  "ser boleirão" e passar no banco 7 dias por semana, ter o carro repleto de menininhas, ir no cabeleireiro todo dia estilo “dama dos anos 1800", ser o maior astro das redes sociais e ter um jatinho particular, isso é um sonho de quem joga vídeo-game, aposta na mega sena e treina com a cabeça para lua apenas umas horinhas por semana já pensando no que fazer pós treino.

Então jovem: você quer ser jogador ou parecer jogador?




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