“Estímulos variados sem um
determinado desenho metodológico
deixam o organismo-humano desorientado”.
Rodrigo Vicenzi Casarin
Dênis de
Lima Greboggy
Na Periodização Tática (PT), o que tem gerado
inúmeras dúvidas (a nós pelo menos), é o Morfociclo Padrão. Este é considerado
como o núcleo duro do processo, e se operacionalizado com uma intencionalidade
prévia, irá gerar o desenvolvimento de uma forma de jogar específica.
O Morfociclo Padrão deve manifestar a forma
de jogar, promovendo alterações nos padrões morfo-funcionais, desde
individuais, até a sincronidade entre estes, formando o jogar que se pretende,
dentro da possibilidade dos jogadores estarem em condições ideais para o jogo. Para
tais condições, é necessário gerir corretamente os aspectos da fadiga,
obviamente dependendo das ideias de jogo e como tal também do contexto em que
se está inserido (algumas dimensões do modelo de jogo).
O que deve ser levado em consideração é que a
fadiga é gerada por diversos fenômenos neuromusculares, os quais são
considerados parte da inteligência humana para a própria sobrevivência da
espécie, ou seja, um dado estímulo causa um desgaste e uma adaptação. E como pode-se
entender isso? Através da Lei de Roux e
o Ciclo de Auto Renovação da Matéria Viva consegue-se entender melhor este fenômeno
de adaptabilidade complexa.
O desenvolvimento do organismo pela Lei de
Roux tem interessantemente duas características: a assimilação da
supercompensação como uma resposta a um estímulo (autoregulação) e a gestão correta da intensidade do mesmo.
Já o CARMV
evidencia que quando se treina, gasta-se matéria orgânica. A base é, como se gasta
e como se regenera a energia? Parte-se do princípio de que todo jogador tem uma
capacidade funcional. Ao
realizar um estímulo, perde-se por um dado momento tal capacidade (gasto de matéria), e o organismo após se recuperar, chega na homeostase e se
organiza até o nível anterior onde é adicionado um algo mais (um plus - fase de exaltação). Assim, o organismo
tem uma capacidade funcional superior do que a anterior.
O primordial é entender que no treinamento,
os estímulos provocam no organismo uma desorganização e decréscimo do desempenho
provocando fadiga. Essa fadiga, no entanto, não é linear, não é com mesma
intensidade em todos os momentos nem no treinamento e nem durante o jogo, bem
como os estímulos, por mais controlados que sejam, não terão a mesma
intensidade a todo momento. Aliás, este é um dos motivos da PT não usar
medidores ou indicadores de intensidade de treinamento, como frequencimetros,
análise de lactato ou outros indicadores fisiológicos, porque a intensidade que
se quer, tem em conta o jogar que se pretende e não apenas o individual, com
aferências abstratas. É uma intensidade máxima relativa ao jogar que se
prentende.
Também é importante perceber que tal intensidade
está intimamente relacionada com o ATP adquirido em curto espaço de tempo pelas
reservas de Creatina Fosfato (CP) musculares, que se ressintetizam de acordo com
a necessidade de cada jogador. Por meio da CP, o ADP originário da utilização
do ATP é retransformado em ATP em um curto processo. É aqui que muitos caem no
famoso paradigma de que é necessário se treinar em acidose para que haja uma
adaptação que faça com que o jogador tenha rendimento em cansaço (isso é burrice). Isso para a
PT é um contrasenso, um paradoxo, porque não há necessidade de acidose
para se obter uma adaptação e alto desempenho. O lactato do corpo e cerebral são
evitados conforme a forma de jogar treinada e “automatizada abertamente”, é uma
adaptabilidade que emerge pelo processo.
Isso significa que, de acordo com os estímulos
organizados adequadamente à maneira que se quer jogar, à configuração que se deseja
para a equipe, isto é, a intensidade relativa que se pretende fazer emergir nas
diferentes escalas, o jogar será pouco comprometido pela fadiga em virtude da adaptabilidade
específica gerada pela operacionalização do morfociclo padrão. Como deixa
explícito nosso amigo Jorge Maciel: “a operacionalização devida do morfociclo, tendo
em consideração as duas leis citadas acima, implica que as vivências de um
jogar se faça salvaguardando o estar fresco para que haja qualidade de
desempenho após momentos de fadiga necessários à aquisição e vivenciação de
um jogar”.
Se o jogar que se pretente vivenciar é um
jogar intenso, com ações intensas, deve-se ter em conta que: estímulos intensos com melhoria funcional, requerem
descanso para se auto-reconstituirem, para que possam ser novamente repetidos,
portanto tal importância do entendimento do “novelo complexo enérgetico” com
predominâncias nas ações aláticas.
No entanto, sabe-se que os sistemas
energéticos estão em constante interação o tempo todo. Mas para esse jogar,
tendo em conta a relação correta entre as vias energéticas, o sistema alático
deve ser o acelerador do “novelo complexo energético”, pois é o mais decisivo.
Outro fator importante é o período de
repouso, que delimita a relação do estar fresco e estar em fadiga, e é o
controle desta relação que permeia a densidade e que condiciona as adaptações
desejadas. As ações aláticas de alta intensidade fracionadas para
gerar uma fadiga relativa e uma adaptabilidade constante devem ser treinadas e
“fractalizadas” na sua dosagem. Isso remete ao entendimento que por meio de treinos
em rítimo alto e com intervalos adequados, se consiguirá gerar adaptações
específicas ao jogar de alta intensidade central-periférica.
Está claro que não se pode reduzir o
morfociclo simplesmente ao sistema alático. O organismo, o jogar, o
morfociclo, os sistemas energéticos são todos complexos e estão em constante
interação. Necessitam de uma intencionalidade, de ideias evoluídas e vivências
de treino férteis jogadas especificamente, para assim emergir o jogar com
determinadas características, com sua intensidade máxima relativa.
Cabe ressaltar que na PT, se usa intensidade máxima
relativa para que seja sobredeterminada por uma intencionalidade macro,
uma intimidade que se reporta à especificidade de uma forma de jogar. Somente
assim se consegue uma adaptabilidade, que se adquire com o tempo (processo).
Deste modo, reforçando novamente para não se ter uma “visão retalhada”: a
lógica do "novelo" enérgetico é consequência deste processo, ou seja, a
maneira de jogar (enquanto emergência consequente das intensidades máximas) vive
na lógica com a solicitação dos metabolismos em simultâneo. Assim, há uma
matriz metabólica funcional que permite concretizar a forma que se quer jogar,
e essa matriz implica os metabolismos todos ao mesmo tempo, mas não
necessariamente da mesma forma, ou seja, o jogo que se pratica resulta de um
funcionamento íntimo dos três metabolismos, e o jogar intenso pretendido tem em
conta o sistema alático como o “eixo do triângulo” para “sempre dar o pontapé
inical na dinâmica relacional constante entre os três”.
Ao treinar diariamente a maneira de jogar, se
está desenvolvendo tal predominância, essa relação específica dos metabolismos,
porque são eles que concretizam a forma de jogar. A relação dos tempos de
realização daquilo que se faz no jogo promove condições para que devolva as
escalas do jogar e não estimule apenas um metabolismo, mais a dinâmica de
funcionamento entre eles.
Amigos, o futebol é um fenômeno plural, e não existe um,
existem vários “futebóis”, inclusive dentro da Periodização Tática. E como diz
o Prof. Vitor Frade, “todas as generalizações são perigosas, inclusive esta”.
Nosso agradecimento em especial
pelos apontamentos e correções aos amigos Jorge Maciel e Rodrigo Almeida. Obrigado
pela ajuda!
Também os nossos especiais cumprimentos ao amigo
Julian Tobar pela conclusão da Obra: "PERIODIZAÇÃO TÁTICA: EXPLORANDO
SUA ORGANIZAÇÃO CONCEPTO-METODOLÓGICA". Sucesso Julian!
Abraços a todos!
Boa noite,
ResponderExcluirConfesso que me espanta o tom pretensioso que é encontrado em muitas publicações relativas à PT, tentando catalogar as metodologias ditas convencionais como retrogradas . Parece-me também que da mesma forma que todas as generalizações são perigosas também serão os extremos metodológicos. A minha questão no fundo é: Se o objectivo final é o jogo e a sua replicação, embora em estruturas mais simplificadas ou não, em treino porque não treinar em acidose? Não acontece esta situação em competição independentemente do modelo de jogo, posição em campo, etc? Penso que é também consensual que o trabalho sobre estas condições melhorará a capacidade de buffering bem como de remoção dos metabólitos causadores dessa mesma acidose do organismo ... Falou-se aqui e muito bem na Lei de Arnoldt-Shultz e no CARMV e parece-me que esta metodologia peca exactamente por não ser capaz de proporcionar a sobrecarga necessária para obter as maiores respostas fisiológicas. Consegue as respostas mais específicas mas não as com maior "dimensão".
Embora não concorde com alguns pontos aqui expostos é uma excelente reflexão! Parabéns!
Um abraço